[ABE-L] Neale E-Dash prevê vitória de Marina
Jose Carvalho
carvalho em statistika.com.br
Seg Set 22 11:08:10 -03 2014
Esse é um assunto muito bom para se discutir.
Cada um forma sua teoria como quer; ou como determina sua cultura.
Admito, de mera observação, que a maioria das pessoas tende a crer
naquilo que já crê. Tais pessoas somam evidência de observações
parciais, fechando os olhos àquilo que não se encaixa na sua teoria e
filtrando o que "confirma". A expressão que mais se ouve é "provar"
alguma ideia, com base em "evidência".
Eu me junto a muitos cientistas achando que evidência "a favor" não
prova coisa alguma. Já a evidência contrária é suficiente para se negar
uma teoria. Incluo entre os "muitos cientistas", claro, o Fisher.
Um exemplo de falsa prova, que cito por ser exemplar, é a lenda do
"santuário" de Lourdes, na França, relatado no livro de 1995, do Carl
Sagan: /*The Demon-Haunted World: Science as a Candle in the Dark.
*/Vale a pena procurar a estorinha. Esse tipo de falsa prova é o que
leva ao que chamamos de crendices. (Mas tenho respeito por crendices, no
bom sentido. Tenho dito que a diferença entre religião e crendice é:
religião é a minha; todas as outras são crendices :-)) )
Procedimentos não sustentáveis de "provas" e de elaboração de
"evidências" estão bem descritos, com ironia, quase humor, no livro de
Taleb (The Black Swan). Para Taleb, por falha que possa ser, sobra
apenas a refutação de hipóteses (teorias), baseadas em evidência contrária.
Dito isto, junto o seguinte. Estamos acostumados aos testes de
hipóteses, construindo H0 que deve ser refutada, com base em níveis de
significância. Pois bem, em ensaios clínicos, em testes de não
inferioridade, exige-se uma aparente "troca" de H0 e H1, para
garantir-se que a decisão se dê pela evidência... contrária. Este tipo
de teste, tão singelo, costuma "fundir a cuca" de alunos. Não é um
problema estatístico, mas meramente de lógica.
É isso... pode-se discutir muito. E devemos. É até uma discussão
agradável. Nathália, você escreveu que basear decisões em refutações de
modelos é Popperiano. É... mas não só Popper. Há mais gente aqui. E a
prática corrente endossa isso. (O que, aceito, nada prova!)
Ah, gostaria de ter mais tempo e energia para escrever mais, mesmo
enchendo a paciência do amigos.
Um abraço.
Zé Carvalho
On 09/22/2014 10:03 AM, Nathália Demétrio wrote:
>
> Desprovar hipoteses é apenas uma opção de abordagem, baseada em uma
> filosofia (Popper), cheia de prós e contras, como tantas outras.
>
> A minha dúvida era se as pesquisas estavam sendo tratadas como
> independentes entre si. Pois, assim como aconteceu na copa, e foi
> levantado pelo Carlinhos, pode ser uma suposição complicada de ser
> mantida.
> Quanto ao peso das amostras, apesar da questão da variância ser de
> fato importante, não trocaria um retrato atual por um de 2 meses
> atrás, por mais observações que tivesse. Dado toda a singularidade
> precedente a uma tragédia.
>
> No mais gostaria de parabenizar Neale pelo trabalho. Tanto o site
> quanto os resultados são muito interessantes. Parabéns.
>
> Em 22/09/2014 09:26, "Jose Carvalho" <carvalho em statistika.com.br
> <mailto:carvalho em statistika.com.br>> escreveu:
>
> E o Nate Silver, com seu método, deu altíssima probabilidade do
> Brasil sagra-se campeão na Copa da FIFA. Por que não se menciona
> isso aqui? Apenas a vez em que ele acertou os resultados de
> eleições em muitos estados americanos é citada? Como diz o (este
> sim grande) Nassim Taleb, trata-se de um "vício de seleção" - o
> povo acredita em "fatos que 'comprovem' suas prévias crenças". Bem
> ao contrário do método científico, que busca desprovar hipóteses.
> Pode ser que este problema afete igualmente cientistas desta lista?
>
> Abs
>
> Zé Carvalho
>
>
> On 09/22/2014 08:35 AM, Raphael Nishimura wrote:
>> Concordo com o Neale e o Marcelo: dizer que Marina tem 58% de
>> chance de vitória é diferente de dizer que ela vai ganhar a
>> eleição. Ou seja, como todos sabemos, se ela não ganhar, não quer
>> dizer que o Neale errou, pois existia uma probabilidade de 42% de
>> ela não ganhar.
>>
>> Mas, simetricamente, se ela ganhar, o Neale também não poderá
>> afirmar que ele acertou, certo?
>>
>> Só estou levantando esse ponto porque Nate Silver, em quem Neale
>> aparentemente se inspirou, fez fama nas eleições de 2012 nos EUA
>> justamente por "prever corretamente" nos 50 estados e distrito de
>> Colúmbia o vencedor. E o "prever corretamente" foi interpretado
>> justamente como tendo o candidato efetivamente vencedor na
>> eleição daquele estado como aquele que o modelo dele apontava ter
>> probabilidade maior que 50% de vencer naquele estado.
>>
>> Um abraço,
>> Raphael
>>
>> Em Domingo, 21 de Setembro de 2014 17:15, Marcelo L. Arruda
>> <mlarruda em terra.com.br> <mailto:mlarruda em terra.com.br> escreveu:
>>
>>
>> Esse é um problema sério com que freqüentemente lido no Chance de
>> Gol.
>> Para os estatísticos, o significado de "prever" pode ser
>> longamente discutido e não vou abrir essa discussão agora.
>> Para o "povão", porém, "prever" significa cravar
>> antecipadamente algo que vai acontecer, ou seja, "adivinhar",
>> "profetizar", "vaticinar"! E aí sempre cabe a observação (nem
>> sempre apreendida pelo interlocutor) de que 58% de probablidade
>> de vitória de X não é o mesmo que afirmar categoricamente que X
>> VAI GANHAR!
>> Marcelo
>>
>> ----- Original Message -----
>> *From:* Luis Paulo Braga
>> *To:* Neale El-Dash ; Lista da ABE
>> *Sent:* Sunday, September 21, 2014 4:44 PM
>> *Subject:* Re: [ABE-L] Neale E-Dash prevê vitória de Marina
>>
>> Qual o significado do verbo prever?
>>
>>
>> Em 21 de setembro de 2014 10:59, Neale El-Dash
>> <neale.eldash em gmail.com> escreveu:
>>
>> Olá Luis, obrigado por postar a "mini" reportagem.
>>
>> Só um comentário: 58% de chance de vitoria é diferente de
>> prever vitória!
>>
>> Abraço
>>
>> Em 21 de setembro de 2014 10:53, Luis Paulo Braga
>> <lpbraga em geologia.ufrj.br> escreveu:
>>
>> Veja
>> *A pesquisa das pesquisas*
>> Desde que Marina Silva entrou na disputa eleitoral,
>> já foram divulgadas 33 pesquisas registradas na
>> Justiça Eleitoral, de cinco institutos. Esses
>> levantamentos mostram o que os analistas chamam de
>> uma "fotografia do momento", mas dizem pouco sobre o
>> que pode acontecer no futuro. Para tentar apontar as
>> chances de vitória de cada candidato, o estatístico
>> Neale El-Dash, ex-diretor de pesquisas do instituto
>> Ipsos nos Estados Unidos, adaptou para o Brasil o
>> método utilizado pelo matemático americano Nate
>> Silver na eleição de 2012, quando ele acertou os
>> resultados em todos os cinquenta estados americanos.
>> Por meio do cruzamento dessas 33 pesquisas, inclusive
>> a do Datafolha divulgada na sexta-feira passada, o
>> estatístico fez 15000 simulações em um programa de
>> computador que permitiram chegar aos cenários com
>> maior probabilidade de se concretizar. O trabalho
>> mostrou que Marina tem 58% de possibilidade de vencer
>> a disputa pela Presidência da República, contra 41%
>> de Dilma Rousseff e 1% de Aécio Neves. A pesquisa de
>> El-Dash deu pesos diferentes a cada levantamento, a
>> partir de variáveis que abrangeram desde o tamanho da
>> amostra utilizada até o histórico de aceitos de cada
>> instituto. À medida que se aproxima a data da
>> eleição, também muda, por exemplo, a influência da
>> margem de erro dos levantamentos.
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