[ABE-L] Usos e abusos dos números

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Sex Dez 22 22:00:27 -03 2017


Prezados colegas

Sempre existiram números que as autoridades interessam escondelos,  
fazendo sempre o possível para não molstra-los ou mostrarem de forma  
que não apresente o seu devido impacto, por exemplo de acordo com os  
diferentes governos e mais um, dados reais relativos a situação das  
pessoas com deficiência.

Saudações,

                  Paulo Tadeu de Oliveira
Citando Denise Britz do Nascimento Silva <denisebritz em gmail.com>:

> Alexandre
>
> acredito sim que os efeitos seriam bons .
>
> Coloquei os gráficos escolhidos para a análise dos dados porque estávamos
> tratando do ensino superior.
>
> Acho também que é necessário melhorar a qualidade e acesso ao ensino
> público em todos os níveis (fundamental, médio e superior).
>
> Acredito que os esforços devem ser concomitantes caso contrário uma geração
> de jovens que atualmente conclui o ensino médio em escolas públicas  (e
> deseja seguir o ensino superior) continuará sem oportunidades nesta corrida
> de obstáculos. Entendo que a cota é um instrumento para promover equidade .
> Muitos discordam da minha opinião.
> E assim... vamos construindo um debate na busca de um caminho para um país
> melhor.
>
> Mas..agora...reconheço ... já falo da minha opinião e não da análise
> informada dos dados...que era o foco inicial das mensagens.
>
> Abraços
> Denise
>
>
>
> Em 22 de dezembro de 2017 17:23, Alexandre Galvão Patriota <
> patriota.alexandre em gmail.com> escreveu:
>
>> Oi Elias ,
>>
>> "me parece claro que diminuir a desigualdade financeira não é o mesmo que
>> diminuir a pobreza." Nessa frase, "diminuir a desigualdade" significa
>> apenas diminuir a lacuna entre o mínimo e o máximo. A principio, isso não
>> tem nada a ver com manter a média fixa. Ilustro abaixo dois casos.
>>
>> Distribuição de renda (caso com baixa desigualdade):
>> B: --[--]--------------------------
>>
>> Distribuição de renda (caso com alta desigualdade):
>> A: ----------------[-------------]--
>>
>> Claro que tem todos os outros casos que não foram citados (alta
>> desigualdade e muitos pobres, baixa desigualdade e poucos pobres). Há
>> politicas econômicas cujo objetivo principal é diminuir a desigualdade
>> punindo os mais ricos (proposta por neo-marxistas como Piketty, por
>> exemplo). Há políticas econômicas que se preocupam em diminuir a pobreza
>> pouco se importando com a desigualdade (proposta por economistas austríacos
>> e outros), e assim por diante.
>>
>>
>> Denise,
>>
>> Muito interessante os gráficos.
>>
>> Seria interessante ver o que aconteceria na renda familiar das pessoas
>> mais pobres, se o Estado aumentasse significativamente a qualidade do
>> ensino básico (fundamental e médio). Por exemplo, professores com
>> bacharelado na área, algumas poucas disciplinas da pedagogia (e não o
>> inverso como é feito hoje) e um bom mestrado, como a Finlândia faz. Os
>> dados do ENADE mostram claramente que os alunos de licenciatura em
>> matemática sabem menos sobre a matéria do que os alunos de bacharelado.
>> Talvez o problema realmente esteja no ensino superior, mas não do jeito que
>> muitos estão pensando...
>>
>>
>> 2017-12-22 16:23 GMT-02:00 Denise Britz do Nascimento Silva <
>> denisebritz em gmail.com>:
>>
>>> Alexandre  e Hedibert
>>>
>>> é verdade que podemos diminuir a desigualdade sem reduzir a pobreza, ou
>>> podemos manter a desigualdade mesmo ficando todos em pior situação
>>> econômica.
>>>
>>> Para contribuir no debate, peço que vejam o gráfico 4.8 da publicação
>>> Síntese de Indicadores Sociais do IBGE 2016 - que compara o acesso dos
>>> estudantes mais pobres ao ensino público superior ( que reproduzo abaixo).
>>>
>>> https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv98965.pdf
>>>
>>> O gráfico indica que, ao considerar a distribuição do rendimento
>>> domiciliar per capita de estudantes da rede pública de ensino superior,   a
>>> parcela proveniente das famílias mais pobres aumentou ao longo de 10 anos,
>>> fornecendo evidência de que a população de estudantes do ensino público
>>> superior  é composta proporcionalmente de mais jovens de famílias com menos
>>> recursos financeiros (que estão conseguindo alcançar o ensino superior
>>> público) .
>>>
>>> Ao mesmo tempo, o gráfico 6.3 indica uma leve tendência da renda
>>> domiciliar per capita mediana (todos os valores corrigidos pela inflação
>>> para base 2015). Deve-se também reconhecer a queda de 2014 para 2015.
>>> Adicionalmente,  o gráfico 6.4 indica que a parcela da população com
>>> rendimento domiciliar per capita mais baixo diminui, se deslocando para
>>> estratos de rendimento superiores adjacentes (mas também houve leve queda
>>> nos estrato superior).
>>>
>>> Acredito que, unindo as evidências, ainda  é possível concluir que, de
>>> 2005 a 2015, as famílias brasileiras não ficaram mais pobres, houve aumento
>>> real de rendimento. Acho então que as famílias dos estudantes não ficaram
>>> mais pobres, entretanto mais estudantes de famílias pobres alcançaram o
>>> ensino superior, indicando  mudança de composição da população de
>>> estudantes do ensino superior público.
>>>
>>> Lembro que os dados referem-se à década 2005-2015.
>>>
>>> Abraços e seguem os gráficos.
>>> Denise
>>>
>>>
>>> [image: Imagem inline 1]
>>>
>>> [image: Imagem inline 2]
>>>
>>> [image: Imagem inline 3]
>>>
>>> Em 22 de dezembro de 2017 14:05, Alexandre Galvão Patriota <
>>> patriota.alexandre em gmail.com> escreveu:
>>>
>>>> Parabéns ao Hedibert e a Tatiana pelo artigo.
>>>>
>>>> Sobre o último parágrafo:
>>>>
>>>> ``Se o objetivo é corrigir as desigualdades do ensino superior público,
>>>> já temos uma política de sucesso: as cotas. De 2010 a 2014, o  
>>>> percentual de
>>>> estudantes com renda familiar de até 3 salários mínimos aumentou 27%, ao
>>>> passo que a faixa acima de 7 salários diminuiu 37%. A política de cotas
>>>> ainda está em fase de implementação e seus efeitos plenos só poderão ser
>>>> medidos em 2018. Tudo leva a crer que o melhor caminho é expandir e
>>>> aprimorar essa política que, em virtude do comprovado aumento salarial dos
>>>> formados, provoca uma efetiva e duradoura redução das desigualdades.´´
>>>>
>>>> Corrijam-me se eu estiver errado, mas: se o percentual de estudantes com
>>>> renda familiar entre [0,3] aumentou 27% e o percentual de estudantes com
>>>> renda familiar entre [7,inf) diminuiu 37%, então podemos afirmar que em um
>>>> certo sentido as famílias dos estudantes estão *mais* pobres. Não quero
>>>> entrar nos detalhes filosóficos das teorias econômicas, mas me  
>>>> parece claro
>>>> que diminuir a desigualdade financeira não é o mesmo que diminuir  
>>>> a pobreza.
>>>>
>>>>
>>>>
>>>> 2017-12-22 9:22 GMT-02:00 Hedibert Lopes <hedibert em gmail.com>:
>>>>
>>>>> Usos e abusos dos números
>>>>> Por Hedibert Lopes e Tatiana Roque
>>>>>
>>>>> http://www.valor.com.br/opiniao/5235489/usos-e-abusos-dos-numeros
>>>>>
>>>>> A regressividade dos gastos com ensino superior público é apontada
>>>>> frequentemente como justificativa para a cobrança de mensalidades. O
>>>>> relatório recente do Banco Mundial afirma, por exemplo, que 65% dos
>>>>> estudantes das universidades federais estão entre os 40% mais ricos. Quem
>>>>> são esses "mais ricos"?
>>>>>
>>>>> Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2015 mostram
>>>>> que nesse grupo de 40% "mais ricos" estão pessoas com renda per capita
>>>>> média de R$ 960,00. O Banco Mundial não define a partir de que renda se
>>>>> pode designar um grupo como o dos mais ricos, nem justifica o  
>>>>> foco nos 40%.
>>>>> Poderíamos selecionar os 30% mais ricos, que ganham acima de R$ 1.200,00;
>>>>> ou os 20%, que ganham acima de R$ 1.700,00. A renda média desses grupos
>>>>> difere pouco. De fato, a distância só aumenta quando selecionamos os 10%
>>>>> mais ricos.
>>>>>
>>>>> Suponhamos que fossem cobradas mensalidades dos estudantes que
>>>>> realmente têm condições de pagar, escalonadas de acordo com a  
>>>>> renda. Usando
>>>>> os dados da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições  
>>>>> Federais de
>>>>> Ensino Superior (Andifes), verificamos que 81% dos estudantes vêm de
>>>>> famílias com renda bruta familiar inferior a R$ 6.500,00, logo  
>>>>> não poderiam
>>>>> pagar. Na faixa de renda familiar bruta entre R$ 6.500,00 e R$ 9.300,00
>>>>> estão 9% dos estudantes (de um total de aproximadamente 1 milhão,
>>>>> somando-se todas as universidades federais do país). Superestimando a
>>>>> capacidade de desembolso em 15%, essas famílias pagariam uma  
>>>>> mensalidade de
>>>>> R$ 1.200,00, perfazendo R$ 1,3 bilhão no total. Já a faixa com renda
>>>>> familiar bruta acima de R$ 9.300,00 compreende 10% dos estudantes, mas é
>>>>> preciso analisar detalhadamente a distribuição de renda nessa faixa.
>>>>>
>>>>> O estudo da desigualdade feito pela Oxfam mostra que, no topo da
>>>>> população, reproduz-se a aberrante desigualdade brasileira: as  
>>>>> famílias 10%
>>>>> mais ricas têm rendimentos médios de R$ 18.000,00, sendo o  
>>>>> rendimento médio
>>>>> das famílias 1% mais ricas de R$ 160 mil. Logo, mantendo nossa estimativa
>>>>> do valor da mensalidade em 15% da renda familiar, obtemos que 9% dos
>>>>> estudantes pagariam R$ 2.700. Já os 1% mais ricos pagariam R$ 4 mil - o
>>>>> valor da mensalidade nas melhores universidades privadas. Somando-se, ao
>>>>> fim, todas as mensalidades possíveis, chegamos a um total de R$ 4,7
>>>>> bilhões, ou seja, em torno de 11% do orçamento anual das universidades
>>>>> federais (de R$ 41 bilhões). Devemos lembrar, contudo, que é necessário
>>>>> subtrair desse percentual o custo de se verificar quem pode ou não pagar
>>>>> (uma operação complexa), além do custo de administrar a cobrança. Na
>>>>> verdade, implementar medidas para melhorar a administração da  
>>>>> universidade
>>>>> - o que não contradiz seu caráter público - poderia ser bem mais efetivo.
>>>>>
>>>>> Resumindo, cobrar mensalidades ajudaria pouco a enxugar o orçamento
>>>>> público e o Banco Mundial parece ter forçado os números para nos  
>>>>> convencer
>>>>> do contrário. O cerne da disputa está nas faixas intermediárias, que nem
>>>>> podem realmente pagar nem entram na categoria de pobres (para fazer jus a
>>>>> bolsas). A solução ventilada para esse grupo de renda média é o crédito,
>>>>> que já mostrou efeitos perversos nos EUA e na Inglaterra, levando a um
>>>>> grave endividamento de estudantes - comprometendo o futuro de jovens que
>>>>> sequer ingressaram no mercado de trabalho.
>>>>>
>>>>> Do ponto de vista matemático, o problema é que a curva de distribuição
>>>>> de renda no Brasil é extremamente assimétrica (quase linear até o decil
>>>>> mais alto), em nada semelhante a uma curva normal.
>>>>>
>>>>> Dito de modo menos técnico, as faixas de renda intermediárias dos
>>>>> brasileiros são muito similares - e excessivamente baixas. Isso  
>>>>> torna pouco
>>>>> rigorosa a separação entre "mais ricos" e "mais pobres", sob o risco de
>>>>> distinguir quem ganha R$ 960 por mês de quem ganha R$ 800. Só um critério
>>>>> qualitativo pode estabelecer a partir de que renda alguém pode ser
>>>>> considerado "não pobre".
>>>>>
>>>>> É positiva a tendência de analisar políticas públicas usando
>>>>> estatísticas. Deve-se tomar cuidado, todavia, com a dissociação entre
>>>>> informações quantitativas e qualitativas. A postura científica  
>>>>> aconselha o
>>>>> uso de estatísticas para confirmar ou refutar perguntas em aberto. Mas as
>>>>> definições dos termos do problema, com impactos sociais significativos,
>>>>> precisam levar em conta o ideal de sociedade que se quer construir.
>>>>>
>>>>> Se o objetivo é corrigir as desigualdades do ensino superior público,
>>>>> já temos uma política de sucesso: as cotas. De 2010 a 2014, o  
>>>>> percentual de
>>>>> estudantes com renda familiar de até 3 salários mínimos aumentou 27%, ao
>>>>> passo que a faixa acima de 7 salários diminuiu 37%. A política de cotas
>>>>> ainda está em fase de implementação e seus efeitos plenos só poderão ser
>>>>> medidos em 2018. Tudo leva a crer que o melhor caminho é expandir e
>>>>> aprimorar essa política que, em virtude do comprovado aumento  
>>>>> salarial dos
>>>>> formados, provoca uma efetiva e duradoura redução das desigualdades.
>>>>>
>>>>> Hedibert Lopes é professor titular de Estatística e Econometria do
>>>>> Insper e foi Professor da Booth School of Business da Universidade de
>>>>> Chicago
>>>>>
>>>>> Tatiana Roque é professora do Instituto de Matemática da UFRJ e foi
>>>>> presidente da Associação dos Docentes da UFRJ (ADUFRJ)
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>>>>> _______________________________________________
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>>>> --
>>>> Prof. Dr. Alexandre G. Patriota,
>>>> Department of Statistics,
>>>> Institute of Mathematics and Statistics,
>>>> University of São Paulo, Brazil.
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>> Prof. Dr. Alexandre G. Patriota,
>> Department of Statistics,
>> Institute of Mathematics and Statistics,
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