[ABE-L] Usos e abusos dos números

Elias T. Krainski eliaskrainski em yahoo.com.br
Sex Dez 22 12:05:57 -03 2017


Interessante a reportagem. Parabéns! Há muitos números por aí para desvendar. Acho que nós deveríamos nos empenhar mais nisso e "desmentir" com os números.

Ontem alguém me contou que assistiu a uma entrevista com um reitor de uma universidade particular. Esse reitor disse que na universidade dele a mensalidade de um certo curso era R$1800,00 e que o gasto na Federal para o mesmo curso era de aprox. R$7000,00 e fez a pergunta "para onde está indo o resto do dinheiro?". Meu amigo (e talvez muitos outros que assistiram) ficaram idignados com esse "desperdício". Tentei explicar para ele a complexidade que é adminstrar uma Federal e o sistema de pregões que já observei valores aprox. 30% mais caros que eu pagaria numa loja em um computador. Mas enfatizei que a principal diferença é que o na Federal há muito gasto com atividades além do ensino em si. Há, por exemplo, laboratórios com equipamentos e ensumos caros enquanto que na referida particular o fim era apenas ensinar e não ensinar+pesquisar. 
Dito isso, está me parecendo que o Brasil sempre quer seguir o modelo americano em tudo. Educação, saúde e política. Mas copiamos muito mal, mesmo coisas que não deram certo por lá. Esquecemos de olhar outros exemplos. Gostaria de recomendar o texto no link a seguir de onde é possível vislumbrar porque nem todos seguem o modelo americano. Talvez a corrupção existente em nosso país torne muito perigoso também seguir o outro modelo. Assim o texto é apenas uma reflecção de alternativa e provavelmente não uma solução a ser copiada https://www.theatlantic.com/business/archive/2016/08/the-american-dream-isnt-alive-in-denmark/494141/

Att.
Elias T. Krainski 

    Em sexta-feira, 22 de dezembro de 2017 10:42:45 BRST, Denise Britz do Nascimento Silva <denisebritz em gmail.com> escreveu:  
 
 Hedibert e Tatiana
Excelente contribuição de vocês para informar o debate.
Vou divulgar em outras redes.
AbraçosDenise
Em 22 de dezembro de 2017 09:22, Hedibert Lopes <hedibert em gmail.com> escreveu:

Usos e abusos dos númerosPor Hedibert Lopes e Tatiana Roque

http://www.valor.com.br/ opiniao/5235489/usos-e-abusos- dos-numeros

A regressividade dos gastos com ensino superior público é apontada frequentemente como justificativa para a cobrança de mensalidades. O relatório recente do Banco Mundial afirma, por exemplo, que 65% dos estudantes das universidades federais estão entre os 40% mais ricos. Quem são esses "mais ricos"?
Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2015 mostram que nesse grupo de 40% "mais ricos" estão pessoas com renda per capita média de R$ 960,00. O Banco Mundial não define a partir de que renda se pode designar um grupo como o dos mais ricos, nem justifica o foco nos 40%. Poderíamos selecionar os 30% mais ricos, que ganham acima de R$ 1.200,00; ou os 20%, que ganham acima de R$ 1.700,00. A renda média desses grupos difere pouco. De fato, a distância só aumenta quando selecionamos os 10% mais ricos.
Suponhamos que fossem cobradas mensalidades dos estudantes que realmente têm condições de pagar, escalonadas de acordo com a renda. Usando os dados da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), verificamos que 81% dos estudantes vêm de famílias com renda bruta familiar inferior a R$ 6.500,00, logo não poderiam pagar. Na faixa de renda familiar bruta entre R$ 6.500,00 e R$ 9.300,00 estão 9% dos estudantes (de um total de aproximadamente 1 milhão, somando-se todas as universidades federais do país). Superestimando a capacidade de desembolso em 15%, essas famílias pagariam uma mensalidade de R$ 1.200,00, perfazendo R$ 1,3 bilhão no total. Já a faixa com renda familiar bruta acima de R$ 9.300,00 compreende 10% dos estudantes, mas é preciso analisar detalhadamente a distribuição de renda nessa faixa.
O estudo da desigualdade feito pela Oxfam mostra que, no topo da população, reproduz-se a aberrante desigualdade brasileira: as famílias 10% mais ricas têm rendimentos médios de R$ 18.000,00, sendo o rendimento médio das famílias 1% mais ricas de R$ 160 mil. Logo, mantendo nossa estimativa do valor da mensalidade em 15% da renda familiar, obtemos que 9% dos estudantes pagariam R$ 2.700. Já os 1% mais ricos pagariam R$ 4 mil - o valor da mensalidade nas melhores universidades privadas. Somando-se, ao fim, todas as mensalidades possíveis, chegamos a um total de R$ 4,7 bilhões, ou seja, em torno de 11% do orçamento anual das universidades federais (de R$ 41 bilhões). Devemos lembrar, contudo, que é necessário subtrair desse percentual o custo de se verificar quem pode ou não pagar (uma operação complexa), além do custo de administrar a cobrança. Na verdade, implementar medidas para melhorar a administração da universidade - o que não contradiz seu caráter público - poderia ser bem mais efetivo.
Resumindo, cobrar mensalidades ajudaria pouco a enxugar o orçamento público e o Banco Mundial parece ter forçado os números para nos convencer do contrário. O cerne da disputa está nas faixas intermediárias, que nem podem realmente pagar nem entram na categoria de pobres (para fazer jus a bolsas). A solução ventilada para esse grupo de renda média é o crédito, que já mostrou efeitos perversos nos EUA e na Inglaterra, levando a um grave endividamento de estudantes - comprometendo o futuro de jovens que sequer ingressaram no mercado de trabalho.
Do ponto de vista matemático, o problema é que a curva de distribuição de renda no Brasil é extremamente assimétrica (quase linear até o decil mais alto), em nada semelhante a uma curva normal.
Dito de modo menos técnico, as faixas de renda intermediárias dos brasileiros são muito similares - e excessivamente baixas. Isso torna pouco rigorosa a separação entre "mais ricos" e "mais pobres", sob o risco de distinguir quem ganha R$ 960 por mês de quem ganha R$ 800. Só um critério qualitativo pode estabelecer a partir de que renda alguém pode ser considerado "não pobre".
É positiva a tendência de analisar políticas públicas usando estatísticas. Deve-se tomar cuidado, todavia, com a dissociação entre informações quantitativas e qualitativas. A postura científica aconselha o uso de estatísticas para confirmar ou refutar perguntas em aberto. Mas as definições dos termos do problema, com impactos sociais significativos, precisam levar em conta o ideal de sociedade que se quer construir.
Se o objetivo é corrigir as desigualdades do ensino superior público, já temos uma política de sucesso: as cotas. De 2010 a 2014, o percentual de estudantes com renda familiar de até 3 salários mínimos aumentou 27%, ao passo que a faixa acima de 7 salários diminuiu 37%. A política de cotas ainda está em fase de implementação e seus efeitos plenos só poderão ser medidos em 2018. Tudo leva a crer que o melhor caminho é expandir e aprimorar essa política que, em virtude do comprovado aumento salarial dos formados, provoca uma efetiva e duradoura redução das desigualdades.
Hedibert Lopes é professor titular de Estatística e Econometria do Insper e foi Professor da Booth School of Business da Universidade de Chicago
Tatiana Roque é professora do Instituto de Matemática da UFRJ e foi presidente da Associação dos Docentes da UFRJ (ADUFRJ)




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