[ABE-L] Ciência Sem Fronteiras

Francisco Cribari cribari em de.ufpe.br
Seg Ago 1 08:24:06 -03 2016


O Estado de São Paulo, 1 de agosto de 2016 - EDITORIAL

O novo Ciência sem Fronteiras

<O programa Ciência sem Fronteiras foi implementado de forma tão inepta que
não restou ao governo do presidente em exercício Michel Temer outra saída a
não ser reformulá-lo integralmente>

Lançado em 2011 pela presidente Dilma Rousseff como uma das mais
importantes iniciativas de sua gestão no campo da educação, o programa
Ciência sem Fronteiras foi implementado de forma tão inepta que não restou
ao governo do presidente em exercício Michel Temer outra saída a não ser
reformulá-lo integralmente.

Planejado para conceder 101 mil bolsas a estudantes brasileiros
interessados em fazer cursos de iniciação científica, mestrado, doutorado,
especialização e pós-doutorado em universidades conceituadas de países
desenvolvidos, o programa tinha por objetivo reduzir a distância entre as
universidades brasileiras e as universidades estrangeiras mais bem
classificadas nos rankings internacionais. Mas, em vez de definir critérios
precisos, estabelecer metas e dar prioridade às áreas técnicas nas quais o
Brasil é carente de especialistas e que são estratégicas para a
qualificação de mão de obra e para o desenvolvimento econômico, como
matemática, física, química e biologia, o governo Dilma financiou
indiscriminadamente cursos em quase todas as áreas do conhecimento,
inclusive aquelas em que o mercado de trabalho está saturado, como
publicidade e comunicações.

Como o governo não exigiu dos bolsistas proficiência no idioma em que as
atividades didáticas seriam realizadas e as provas seriam aplicadas, muitos
não conseguiram acompanhar os cursos em que se matricularam e voltaram ao
Brasil sem aperfeiçoar sua formação intelectual. Houve, também, bolsistas
que não conseguiram ser aprovados nos exames seletivos das universidades e
centros de pesquisa que escolheram. E, por falta de acompanhamento
acadêmico e cobrança de resultados, um contingente expressivo de bolsistas
abandonou os estudos e usou o valor das bolsas para fazer turismo.

Só em 2015, o Ciência sem Fronteiras financiou 35 mil bolsistas, a um custo
de R$ 3,2 bilhões aos cofres públicos, valor equivalente ao que foi gasto
pelo Ministério da Educação para atender 39 milhões de alunos do programa
federal de merenda escolar. Por causa da sucessão de erros administrativos
do governo Dilma, parte desse investimento não retornará ao País em forma
de capacitação profissional e qualificação acadêmica com padrão de
excelência. Os gastos com estudantes que não conseguiram acompanhar aulas,
não concluíram um curso acadêmico ou se limitaram a fazer turismo tiveram
de ser contabilizados como prejuízo para os cofres públicos.

Para acabar com o buraco negro nas finanças públicas em que o Ciência sem
Fronteiras se converteu, o governo do presidente em exercício Michel Temer
está avaliando as medidas que foram propostas pelos especialistas quando o
programa foi lançado. Em vez de conceder indiscriminadamente qualquer tipo
de bolsa, a ideia é acabar com as bolsas de graduação e concentrar recursos
no financiamento do intercâmbio de doutorandos e de estudantes da rede
pública de ensino médio e oriundos de famílias de baixa renda.

Além disso, as autoridades educacionais pretendem criar mecanismos de
acompanhamento acadêmico dos bolsistas, racionalizar os gastos com as
bolsas e corrigir distorções. O gasto com uma bolsa de graduação do Ciência
sem Fronteiras equivale ao financiamento de um curso integral de quatro
anos no Brasil para três alunos. “É preciso considerar a questão do
custo/benefício porque o País tem carências, como é o caso do ensino
básico”, diz o presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de
Nível Superior (Capes), Geraldo Nunes. “O programa foi mal concebido e o
MEC teve de tirar dinheiro de outras áreas e de pesquisas de pós-graduação
para financiá-lo”, afirma Simon Schwartzman, do Instituto de Estudos do
Trabalho e Sociedade. Com a reformulação do Ciência sem Fronteiras, o
programa será bem menos ambicioso do que o original. Mas, se for
implementado com eficiência, poderá dar muito mais resultados para a
qualificação das novas gerações e para o desenvolvimento do País.
-------------- Próxima Parte ----------
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