[ABE-L] A Academia Agoniza

Gauss Cordeiro gauss em de.ufpe.br
Sáb Jan 28 11:52:51 -03 2017


Texto publicado ontem na Folha de Pernambuco.




                                              *A Academia Agoniza*

                                                     Gauss M. Cordeiro*



Nas prestigiosas universidades estrangeiras, a carreira acadêmica é viva,
dinâmica e evolutiva e norteada pelos valores de competência, eficiência e
disciplina. A produtividade científica permeia as atividades-fim e o
objetivo primordial é formar bons profissionais com conhecimentos técnicos,
filosóficos, científicos e artísticos que produzam muitos efeitos benéficos
na sociedade. Nelas, o ensino superior é realmente de qualidade.


Às avessas, existe um gigantismo que assola as nossas universidades
públicas (estaduais e federais) e um número significativo de professores só
faz cumprir carga horária. Com efeito, esses docentes se dedicam a outras
atividades que lhes oferecem maior retorno financeiro. Muitos outros
professores não têm qualquer interesse na pesquisa científica, o que se
reflete na nossa baixa produtividade científica e no desempenho pífio do
ensino de qualidade. Muito poucas áreas do conhecimento do País aparecem entre
as 200 melhores do planeta quando avaliadas nos mais conceituados *rankings*
acadêmicos internacionais. Em nossas instituições, ocorre um nivelamento
por baixo que não permite distinguir aqueles que realmente produzem
daqueles que apenas hibernam. A variável "mérito" não faz parte de muitos
objetivos da vida acadêmica. Nas universidades federais, por exemplo, para
ascender na carreira, basta não fazer nada. A promoção ocorre quase de
forma automática por tempo de serviço. O corolário mais evidente é
inevitável: irrelevância da grande maioria dessas instituições no cenário
científico internacional.


Adicionalmente, os sindicatos docentes são formados, em boa parte, por
professores que não têm o mínimo compromisso com a pesquisa e, obviamente,
seus interesses são norteados pelo corporativismo exacerbado. Se fosse
colocada em artigos científicos a mesma energia gerada em debates
sindicais, o Brasil seria uma superpotência. Aqueles professores que
realmente ensinam e publicam ganham muito mal, mas os demais que não fazem
essas duas atividades ganham bem. Essa distorção precisaria ser corrigida
de forma firme pelo Governo Federal.


Ao longo dos últimos anos, presenciamos vários eventos que se combinam para
desmantelar qualquer ambiente acadêmico no País que pretenda esboçar
excelência. Nominalmente, temos: invasões descabidas de salas de aulas e de
prédios das universidades por alunos delapidando o patrimônio público;
destruição dos valores acadêmicos baseados no mérito; infraestrutura
extremamente precária; greves literalmente direcionadas por simpatizantes
de partidos políticos, numa nítida afronta à nobreza e à pluralidade das
nossas instituições, prejudicando milhares de alunos que realmente querem
estudar; vestibular com fraquíssimo crivo de seleção; excessivas
preocupações com evasão ou reprovação, mas pouco esforço em melhorar o
ensino; priorização em criar novos cursos e diplomar alunos em grande
quantidade sem necessariamente zelo pela qualidade; desmotivação dos
professores mais destacados. Efetivamente, vem-se introduzindo de forma
acentuada ações assistencialistas que exaltam apenas a mediocridade.


Pior ainda, persiste preocupante que grandes instituições privadas de
ensino superior se comportam apenas como meras fábricas de diplomas que
objetivam não mais que maximizar o lucro deixando à margem a qualidade
acadêmica. Sir Winston Churchill afirmava que os “impérios do futuro são
impérios da mente”. Infelizmente, o ensino superior do Brasil persiste na
contra mão dos países desenvolvidos.



*Gauss M. Cordeiro, professor titular da UFPE.
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