[ABE-L] Formação de Bacharéis em Estatística - Brasil x EUA

Marcus Nunes marcus.nunes em gmail.com
Sáb Ago 18 09:02:54 -03 2018


Olá a todos,

Eu acho a estatística no Brasil muito preocupada com a academia em si. Os
professores dos departamentos de estatística (e me incluo nesta lista)
geralmente fazem graduação, mestrado e doutorado um atrás do outro, sem ter
experiência profissional no mercado. Isto se refletiu num aumento da
produção científica nacional na última década, mas ao custo de deixarmos de
lado outros aspectos da formação dos nossos alunos.

Quanto a isso, tenho um parênteses para contar. Recentemente, ouvi um
professor mais experiente em outra universidade me contar que o mais novo
membro do corpo docente do seu departamento não sabia como fazer extensão
universitária utilizando estatística. É uma evidência anedótica, mas acho
que reflete um pouco como os nossos programas de pós-graduação tem agido
quanto a uma formação mais geral de nossos mestres e doutores.

Além disso, a universidade brasileira não dá muitos incentivos para quem
quer fazer algo diferente de publicar artigos. A UFRN, onde leciono, é uma
das poucas exceções que conheço. Ao menos aqui eu consigo submeter projetos
de extensão, normalmente agraciados com bolsa, nos quais eu e outros
professores treinamos os alunos do curso a prestar consultoria para outros
departamentos da universidade e, em casos raros, até mesmo fora dela.

Isso acaba gerando um problema recorrente. Nós trazemos os melhores
pesquisadores para dentro da universidade. Estes pesquisadores vão formar
outros pesquisadores, tão bons quanto ou melhores que seus orientadores.
Isso se repete ad infinitum e, quando vamos ver, chegamos num estágio em
que quase a totalidade dos docentes se preocupa apenas com pesquisa.
Entendo que isto também é culpa da Capes e do CNPq. Afinal, porque um
professor vai fazer algo diferente de pesquisar se ele não é recompensado
por isso? Ele vai ganhar mais recursos das agências de fomento justamente
se ele se dedicar seu tempo mais e mais à pesquisa.

Eu vejo nossos cursos de Estatística ficando para trás, perdendo espaço
para Ciência da Computação e Engenharias. Excetuando uma ou outra
universidade que quer modernizar o seu curso (por exemplo, o Departamento
de Estatística a UFPB abriu um concurso para professor cuja área de
conhecimento é Aprendizagem de Máquina e Métodos Computacionais em
Estatística), vejo a gente como um todo ainda muito preso à inferência. Não
que não seja importante, mas faltam, em nossos currículos como um todo,
mais preocupação com novas técnicas estatísticas e visualização de dados.

Quanto ao CONRE, eu gostaria de fazer parte, mas não posso. De acordo com a
lei nº 4.739/65 e regulamento aprovado pelo decreto nº 62.497/68, eu que
sou PhD em Estatística pela Penn State, com diploma revalidado pela UFSCar,
não posso ter registro de estatístico por ser Bacharel em Matemática. Ou
seja, eu formo e oriento estatísticos, mas eu mesmo não posso ser
considerado um.

Abs,

Em sex, 17 de ago de 2018 23:53, Doris Fontes <dsfontes em gmail.com> escreveu:

> Colegas, boa noite,
>
> Achei esse artigo interessante da ASA:
> http://magazine.amstat.org/blog/2018/08/01/2017-degree-report/
>
> Enquanto aqui, desde 2004 (quando eu comecei a acompanhar o Censo do
> INEP), temos a seguinte situação, resumidamente:
>
> Nº de programas de Graduação em Estatística aqui e nos EUA, além do
> programa de mestrado em estatística. Notem que o número de bacharelados em
> estatística aqui no Brasil cresce a partir de 2007, acredito eu, por causa
> do REUNI.
>
> [image: image.png]
>
> Sem contar que lá existem muitos programas de graduação e pós somente em
> BIOESTATÍSTICA, enquanto que aqui só temos UM programa de mestrado (UEM) e
> nenhum bacharelado.
>
> Em termos de egressos, temos a seguinte situação (até o último censo
> divulgado do INEP):
>
> [image: image.png]
>
> Um fato relevante nos EUA é a explosão de interessados no programa de AP
> STATISTICS: saltou de menos de 8 mil em 1997 para pouco mais de 205 mil
> participantes em 2016.
>
> (The AP Statistics course is equivalent to a one-semester, introductory,
> non-calculus-based college course in statistics. The course introduces
> students to the major concepts and tools for collecting, analyzing, and
> drawing conclusions from data. There are four themes in the AP Statistics
> course: exploring data, sampling and experimentation, anticipating
> patterns, and statistical inference. Students use technology,
> investigations, problem solving, and writing as they build conceptual
> understanding.
> https://apcentral.collegeboard.org/courses/ap-statistics/course)
>
> [image: image.png]
>
>
>
> Comparando egressos vs vagas oferecidas pelas universidades brasileiras,
> temos:
>
> [image: image.png]
>
>
>
> Formandos por tipo de universidade:
>
> [image: image.png]
>
>
> O número de vagas oferecidas também cresceu a partir de 2007 (REUNI), mas
> o número de egressos não aumentou. Está estagnado ou, pior, menor que em
> 2004. Poderíamos dizer que, a grosso modo, a taxa de evasão da estatística
> beira os 75%.
>
> No Brasil já começa a aparecer programas de graduação e pós em Ciência de
> Dados, como no Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, em Belo
> Horizonte (MG). Não sei qual a qualidade desses programas. Alguns cursos de
> pós chegam a abordar apenas introdução à estatística.
>
> As vagas para profissionais de Analytics/Big Data/Data Science cresce
> muito no mundo  todo. Se você entrar hoje no site do indeed.com e fizer
> uma busca por "analytics", vai encontrar algo como 140 mil vagas. Lógico
> que tem muita coisa misturada, mas mostra o potencial de mercado para quem
> sabe analisar dados. No blog do CONRE-3 de Oportunidades de Trabalho para
> Estatísticos (https://www.facebook.com/groups/statjobs/), hoje com pouco
> mais de 11 mil membros, temos divulgado mais de 2 mil vagas de trabalho por
> ano -- e são vagas parciais, pois muitas empresas publicam apenas na Catho,
> ou sequer divulgam (preenchimento através de indicações somente). Se
> formamos menos de 400 num ano, está claro que não temos capacidade para
> prover profissionais para o mercado interno. Pior ainda, alguns bons
> estatísticos saem do país.
>
> Talvez possamos pensar juntos sobre formas de melhorar esse índice de
> evasão, num programa conjunto, mais agressivo, de divulgação da nossa área
> junto aos alunos do ensino médio. O CONRE-3 tem recursos bem pequenos
> (muito em função do desinteresse dos estatísticos pelo seu conselho
> profissional -- às vezes até boicote de formandos e professores), mas,
> dentro do possível, temos tentado implementar muitos programas de
> valorização, divulgação e fortalecimento da nossa profissão: eventos
> ligados ao mercado de trabalho, TENDA ESTATÍSTICA (através de esforço
> conjunto com a ABE e SBPC) para estudantes de todas as idades, palestras em
> escolas ou envio de material de divulgação da estatística aos alunos de EM;
> ajuda aos deptos de estatística com palestras e materiais de apoio; ajuda a
> eventos variados (como o SINAPE, RBras/SEAGRO, Semests, feira de
> profissões, etc). Somos auditados anualmente pelo TCU e não temos muita
> flexibilidade para o uso de nossa verba, então, trabalhamos dentro das
> nossas possibilidades.
>
> O problema de evasão é grave, triste e precisa ser estudado e combatido.
> Alegar simplesmente que os alunos que entram são fracos não é razoável. A
> falta de prestígio da nossa área pode atrair um monte de alunos
> interessados apenas na baixa concorrência nos vestibulares. Isso não é bom.
>
> Na última reunião que o Julio Trecenti (presidente do CONRE-3) e eu (como
> vice-presidente) tivemos no conselho federal, no RJ, discutimos a "morte"
> da nossa carreira no mercado de trabalho para o cientista de dados. Já há
> deptos de computação interessados em oferecer Bacharelado em Ciência de
> Dados, assim como há engenharias interessados em "Engenharia Estatística".
>
> Enfim, pensei em compartilhar um pouco das minhas preocupações.
>
> Bom final de semana e abraços a todos,
> Doris
>
>
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