[ABE-L] Usos e abusos dos números
poliveir em ime.usp.br
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Qua Dez 27 09:16:10 -03 2017
Prezados colegas
O mesmo comigo acontece com a questão das pessoas com deficiência com
dados que estão digamos escondidos sem saber onde eles estão e também
com dados que muitas vezes não são tratados corretamente por erros ou
mesmo de forma premeditrada visando a outras intenções.
Saudaçõies,
Paulo Tadeu de Oliveira
Citando Maria Eulalia Vares <eulalia em im.ufrj.br>:
> Parabéns a Hedibert e Tatiana pelo artigo! Agradeço também a Denise
> pelos dados.
> Eles estavam aí disponíveis, mas a gente nem sempre sabe one buscar
> e às vezes fica
> tendo que argumentar sem a clareza que estes dados conferem.
>
> Feliz 2018 para todos.
>
> Eulalia
>
> ---------- Original Message -----------
> From: Denise Britz do Nascimento Silva <denisebritz em gmail.com>
> To: Alexandre Patriota <patriota.alexandre em gmail.com>
> Cc: abe-Lista <abe-l em ime.usp.br>
> Sent: Fri, 22 Dec 2017 16:23:29 -0200
> Subject: Re: [ABE-L] Usos e abusos dos números
>
>> Alexandre e Hedibert
>>
>> é verdade que podemos diminuir a desigualdade sem reduzir a
>> pobreza, ou podemos manter a desigualdade mesmo ficando todos em
>> pior situação econômica.
>>
>> Para contribuir no debate, peço que vejam o gráfico 4.8 da
>> publicação Síntese de Indicadores Sociais do IBGE 2016 - que
>> compara o acesso dos estudantes mais pobres ao ensino público
>> superior ( que reproduzo abaixo).
>>
>> https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv98965.pdf
>>
>> O gráfico indica que, ao considerar a distribuição do rendimento
>> domiciliar per capita de estudantes da rede pública de ensino
>> superior, a parcela proveniente das famílias mais pobres aumentou
>> ao longo de 10 anos, fornecendo evidência de que a população de
>> estudantes do ensino público superior é composta proporcionalmente
>> de mais jovens de famílias com menos recursos financeiros (que
>> estão conseguindo alcançar o ensino superior público) .
>>
>> Ao mesmo tempo, o gráfico 6.3 indica uma leve tendência da renda
>> domiciliar per capita mediana (todos os valores corrigidos pela
>> inflação para base 2015). Deve-se também reconhecer a queda de 2014
>> para 2015. Adicionalmente, o gráfico 6.4 indica que a parcela da
>> população com rendimento domiciliar per capita mais baixo diminui,
>> se deslocando para estratos de rendimento superiores adjacentes
>> (mas também houve leve queda nos estrato superior).
>>
>> Acredito que, unindo as evidências, ainda é possível concluir que,
>> de 2005 a 2015, as famílias brasileiras não ficaram mais pobres,
>> houve aumento real de rendimento. Acho então que as famílias dos
>> estudantes não ficaram mais pobres, entretanto mais estudantes de
>> famílias pobres alcançaram o ensino superior, indicando mudança de
>> composição da população de estudantes do ensino superior público.
>>
>> Lembro que os dados referem-se à década 2005-2015.
>>
>> Abraços e seguem os gráficos.
>> Denise
>>
>>
>> Em 22 de dezembro de 2017 14:05, Alexandre Galvão Patriota
>> <patriota.alexandre em gmail.com> escreveu:
>>
>>
>> Parabéns ao Hedibert e a Tatiana pelo artigo.
>>
>> Sobre o último parágrafo:
>>
>> ``Se o objetivo é corrigir as desigualdades do ensino superior
>> público, játemos uma política de sucesso: as cotas. De 2010 a 2014,
>> o percentual de estudantes com renda familiar de até 3 salários
>> mínimos aumentou 27%,ao passo que a faixa acima de 7 salários
>> diminuiu 37%. A política de cotas ainda está em fase de
>> implementação e seus efeitos plenos só poderão ser medidos em 2018.
>> Tudo leva a crer que o melhor caminho é expandir e aprimorar essa
>> política que, em virtude do comprovado aumentosalarial dos
>> formados, provoca uma efetiva e duradoura redução das
>> desigualdades.´´
>>
>> Corrijam-me se eu estiver errado, mas: se o percentual de
>> estudantes com renda familiar entre [0,3] aumentou 27% e o
>> percentual de estudantes com renda familiar entre [7,inf) diminuiu
>> 37%, então podemos afirmar que em um certo sentido as famílias dos
>> estudantes estão mais pobres. Não quero entrar nos detalhes
>> filosóficos das teorias econômicas, mas me parece claro que
>> diminuir a desigualdade financeira não é o mesmo que diminuir a
>> pobreza.
>>
>> 2017-12-22 9:22 GMT-02:00 Hedibert Lopes <hedibert em gmail.com>:
>>
>>
>> Usos e abusos dos números
>> Por Hedibert Lopes e Tatiana Roque
>>
>> http://www.valor.com.br/opiniao/5235489/usos-e-abusos-dos-numeros
>>
>> A regressividade dos gastos com ensino superior público é apontada
>> frequentemente como justificativa para a cobrança de mensalidades.
>> O relatório recente do Banco Mundial afirma, por exemplo, que 65%
>> dos estudantes das universidades federais estão entre os 40% mais
>> ricos. Quem são esses "mais ricos"?
>>
>> Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2015
>> mostram que nesse grupo de 40% "mais ricos" estão pessoas com renda
>> per capita média de R$ 960,00. O Banco Mundial não define a partir
>> de que renda se pode designar um grupo como o dos mais ricos, nem
>> justifica o foco nos 40%. Poderíamos selecionar os 30% mais ricos,
>> que ganham acima de R$ 1.200,00; ou os 20%, que ganham acima de R$
>> 1.700,00. A renda média desses grupos difere pouco. De fato, a
>> distância só aumenta quando selecionamos os 10% mais ricos.
>>
>> Suponhamos que fossem cobradas mensalidades dos estudantes que
>> realmente têm condições de pagar, escalonadas de acordo com a
>> renda. Usando os dados da Associação Nacional dos Dirigentes das
>> Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), verificamos que
>> 81% dos estudantes vêm de famílias com renda bruta familiar
>> inferior a R$ 6.500,00, logo não poderiam pagar. Na faixa de renda
>> familiar bruta entre R$ 6.500,00 e R$ 9.300,00 estão 9% dos
>> estudantes (de um total de aproximadamente 1 milhão, somando-se
>> todas as universidades federais do país). Superestimando a
>> capacidade de desembolso em 15%, essas famílias pagariam uma
>> mensalidade de R$ 1.200,00, perfazendo R$ 1,3 bilhão no total. Já a
>> faixa com renda familiar bruta acima de R$ 9.300,00 compreende 10%
>> dos estudantes, mas é preciso analisar detalhadamente a
>> distribuição de renda nessa faixa.
>>
>> O estudo da desigualdade feito pela Oxfam mostra que, no topo da
>> população, reproduz-se a aberrante desigualdade brasileira: as
>> famílias 10% mais ricas têm rendimentos médios de R$ 18.000,00,
>> sendo o rendimento médio das famílias 1% mais ricas de R$ 160 mil.
>> Logo, mantendo nossa estimativa do valor da mensalidade em 15% da
>> renda familiar, obtemos que 9% dos estudantes pagariam R$ 2.700. Já
>> os 1% mais ricos pagariam R$ 4 mil - o valor da mensalidade nas
>> melhores universidades privadas. Somando-se, ao fim, todas as
>> mensalidades possíveis, chegamos a um total de R$ 4,7 bilhões, ou
>> seja, em torno de 11% do orçamento anual das universidades federais
>> (de R$ 41 bilhões). Devemos lembrar, contudo, que é necessário
>> subtrair desse percentual o custo de se verificar quem pode ou não
>> pagar (uma operação complexa), além do custo de administrar a
>> cobrança. Na verdade, implementar medidas para melhorar a
>> administração da universidade - o que não contradiz seu caráter
>> público - poderia ser
> bem mais efetivo.
>>
>> Resumindo, cobrar mensalidades ajudaria pouco a enxugar o orçamento
>> público e o Banco Mundial parece ter forçado os números para nos
>> convencer do contrário. O cerne da disputa está nas faixas
>> intermediárias, que nem podem realmente pagar nem entram na
>> categoria de pobres (para fazer jus a bolsas). A solução ventilada
>> para esse grupo de renda média é o crédito, que já mostrou efeitos
>> perversos nos EUA e na Inglaterra, levando a um grave endividamento
>> de estudantes - comprometendo o futuro de jovens que sequer
>> ingressaram no mercado de trabalho.
>>
>> Do ponto de vista matemático, o problema é que a curva de
>> distribuição de renda no Brasil é extremamente assimétrica (quase
>> linear até o decil mais alto), em nada semelhante a uma curva normal.
>>
>> Dito de modo menos técnico, as faixas de renda intermediárias dos
>> brasileiros são muito similares - e excessivamente baixas. Isso
>> torna pouco rigorosa a separação entre "mais ricos" e "mais
>> pobres", sob o risco de distinguir quem ganha R$ 960 por mês de
>> quem ganha R$ 800. Só um critério qualitativo pode estabelecer a
>> partir de que renda alguém pode ser considerado "não pobre".
>>
>> É positiva a tendência de analisar políticas públicas usando
>> estatísticas. Deve-se tomar cuidado, todavia, com a dissociação
>> entre informações quantitativas e qualitativas. A postura
>> científica aconselha o uso de estatísticas para confirmar ou
>> refutar perguntas em aberto. Mas as definições dos termos do
>> problema, com impactos sociais significativos, precisam levar em
>> conta o ideal de sociedade que se quer construir.
>>
>> Se o objetivo é corrigir as desigualdades do ensino superior
>> público, já temos uma política de sucesso: as cotas. De 2010 a
>> 2014, o percentual de estudantes com renda familiar de até 3
>> salários mínimos aumentou 27%, ao passo que a faixa acima de 7
>> salários diminuiu 37%. A política de cotas ainda está em fase de
>> implementação e seus efeitos plenos só poderão ser medidos em 2018.
>> Tudo leva a crer que o melhor caminho é expandir e aprimorar essa
>> política que, em virtude do comprovado aumento salarial dos
>> formados, provoca uma efetiva e duradoura redução das desigualdades.
>>
>> Hedibert Lopes é professor titular de Estatística e Econometria do
>> Insper e foi Professor da Booth School of Business da Universidade
>> de Chicago
>>
>> Tatiana Roque é professora do Instituto de Matemática da UFRJ e foi
>> presidente da Associação dos Docentes da UFRJ (ADUFRJ)
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>> Prof. Dr. Alexandre G. Patriota,
>> Department of Statistics,
>> Institute of Mathematics and Statistics,
>> University of São Paulo, Brazil.
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