[ABE-L] resultado do PISA

Pedro Luis do Nascimento Silva pedronsilva em gmail.com
Sáb Dez 10 22:15:59 -03 2016


Caros redistas,

Concordo com o Adriano no seguinte resumo: a questão da Educação no Brasil
não se esgota dentro da Escola. Há muitos fatores externos que influenciam
o aprendizado e ao final o resultado da educação - a literatura já
existente no Brasil demonstra isso de forma contundente.

Entretanto, não avançaremos muito se por reconhecer essa realidade,
deixarmos de discutir e buscar melhorias também no que acontece dentro da
Escola.

Fizemos bom progresso em oferecer 'escola para todos'. As taxas de
cobertura do ensino fundamental no Brasil alcançaram patamares que nos
permitem reconhecer essa melhoria.

Por outro lado, ainda temos parcela substancial da população frequentando
escolas que operam em turnos de meio dia (manhã, tarde ou mesmo noite),
inclusive para o ensino fundamental. Logo o número de anos que uma criança
passa na escola no Brasil devia ser ajustado pelo tempo que de fato ela tem
dentro do sistema escolar, pois crianças frequentando escola de tempo
integral terão bem mais tempo que as das escolas de turnos. Essa
estatística ainda não é produzida assim, e portanto, temos dados
incompletos sobre o tema.

Nos países que se saem melhor no PISA, esta é uma questão superada. A
grande maioria das crianças frequenta escola de tempo integral.

Na sequência precisamos reconhecer as dificuldades com a qualidade da
educação oferecida em muitas escolas. Nossas escolas têm certamente muito
que fazer nessa questão, mas vão precisar de grande apoio da sociedade para
isso.

Não vai ser pagando salários de professor do ensino fundamental como os que
temos hoje, nem com a baixa valorização que tem a carreira docente na
escola fundamental. Ter um filho que vira professor universitário é motivo
de orgulho dos pais, mas quando o filho vira professor do ensino
fundamental o mesmo não ocorre... Até quando?

Não tenho respostas. Mas creio que para resolver problemas, a fase mais
importante é acertar nas perguntas.

Então vamos continuar debatendo: ao menos, já passamos da fase de negar que
temos problemas...

Saudações dominicais a todos.

Pedro.

Em 10 de dezembro de 2016 09:29, Adriano Polpo de Campos <apolpo em ime.usp.br>
escreveu:

> Car(a)os redistas,
>
> Desculpem minha longa mensagem e possíveis erros de português. Acredito
> que eu fujo um pouco do tema PISA, mas já li muitas discussões nesta lista
> sobre diversos assuntos do nosso cotidiano. Não consigo separá-los e por
> isso, resolvi escrever.
>
> Sobre o resultado do PISA, comparando com outros países: desculpem-me, mas
> não vejo a mesma desgraça dos colegas. Não que eu ache que o ensino está
> bem no Brasil, mas não está nenhuma maravilha na Europa ou Estados Unidos,
> que tem bolinhas azuis. Não digo sobre a Ásia pois não tenho informações
> sobre estas localidades.
>
> Eu morei nos Estados Unidos por 1 ano e conheço alguns professores
> universitários de lá. A realidade das universidades deles não é nem um
> pouco animadora. A qualidade dos alunos que entram são, a meu ver, piores
> do que os alunos que nós recebemos em nossas universidades. Claro, lá todos
> se formam na graduação, mas não podemos comparar as graduações, nós somos
> muito mais exigentes que eles (percepção minha). Tanto é que os programas
> de Doutorado (em estatística, ao menos) praticamente não tem americanos.
> São na maioria estrangeiros (chineses, indianos, leste europeu, ...), em
> geral, pessoas buscando melhores oportunidades.
>
> Já na Europa, conheço também alguns professores universitários. Um deles
> relatou que um aluno do 3 ano (último ano!) de um curso de exatas não sabia
> limite, o conceito matemático de limite. Ele ainda enfatizou: "não estou
> dizendo derivada, integral, se soubessem somente limite já seria muito
> bom". Detalhe, um professor inglês me disse que integral e derivada era
> conteúdo do "ensino médio" deles, que um aluno de universidade entrava
> sabendo isso! Será?
>
> Nós criticamos nossos alunos na universidade, sim, eu também o faço. Os
> próprios alunos o fazem. A frase mais comum é: "nossa, o que aconteceu, os
> alunos que estão entrando a cada ano estão piores". Agora, até onde eu sei,
> esta frase é dita desde os tempos de D.Pedro. A nossa percepção é sempre
> que o que estava antes era melhor e o que vem depois é pior. Minha bisavó,
> que era analfabeta, dizia isso sobre os netos dela (meus tios e pais). Que
> eles eram muito piores do que a geração dela. Só que os netos dela
> formaram-se em universidades. Quem tem razão? Para mim o fato é, existe
> diferença, no mínimo cultural, mas medir inteligência, não tento (claro, o
> objetivo do PISA não é medir inteligência e não é sobre isso que falo).
>
> Obviamente, o PISA é sobre "crianças" de 15 anos. Logo, a comparação entre
> os alunos dos diversos países no nível universitário é injusto. Afinal,
> quantas universidades temos no Brasil? Selecionamos somente os melhores
> entre o todo. Talvez estes nossos melhores são melhores que os alunos da
> Europa e Estados Unidos, em que por lá, quase todos vão para universidade.
>
> Neste caso, vou me referir aos Estados Unidos, que conheço um pouco mais.
> O nível de conhecimento do americano em geral, não é nenhuma maravilha. Eu
> não acredito que eles tenham um ensino excelente. O problema não é a
> escola, mas sim a pobreza. Eles tem sim uma condição de vida melhor que a
> nossa (como população). Consequentemente, as crianças conseguem ir para as
> escolas por mais tempo e bem alimentadas, em escolas com boas
> infraestruturas. Tudo é uma maravilha? Não, longe disso. Neste caso, talvez
> o resultado do PISA está refletindo outra coisa e não o ensino.
>
> Acho que nós (sociedade, eu incluído) focamos muito no lugar errado para
> buscar a solução do problema. Por isso, raramente conseguimos resolver (ou
> temos a sensação que não há solução para o problema).
>
> Para mim os problemas são:
> 1) Justiça. País sem um sistema de justiça descente não tem como melhorar.
> (por justiça descente entenda: o povo com medo de ser punido respeita as
> leis. No brasil o medo da punição é muito baixo ou, se preferir, a certeza
> da impunição é quase unanime).
>
> 2) Condição de vida: Comida na mesa! Teto! Criança que não precise
> trabalhar.
>
> 3) Segurança Pública: Não ter medo de ir e vir. Vivemos em nossas prisões,
> com cercas elétricas defendendo nossas casas. Alarmes, câmeras de
> segurança, carros blindados, rotinas e atos de segurança (não sair a noite
> sozinho, trancar tudo, não andar a pé, evitar aquela região mais violenta,
> ...).
>
> 4) Ensino: condição de trabalho para o professor. Diminuir o tempo dentro
> de sala de aula, permitido que este prepare sua aula e tenha tempo para
> capacitação contínua. Salários mais atraentes. Professores, do ensino
> básico, deveriam ser os mais importantes de todos, os mais valorizados, é
> ali que a criança começa sua vida (minha opinião, apenas).
>
> Sem 1, 2 e 3, é bem difícil conseguir o 4. Sem o 4, complicado será para
> termos 1 e 3. Sem 2, o 3 fica difícil de atingir... e por ai vai.
> Resumindo: não vejo como separar estas coisas. Notem que eu não incluí
> saúde em minha lista, não porque não acho importante, mas porque com os
> pontos acima funcionando, a saúde o povo reclama! Ok, pode ser simplista,
> inclua o item 5 saúde ou o inclua no item 2 (que não deixa de ser
> razoável). Mas todos os itens devem ser tratados e olhados ao mesmo tempo.
> Não podemos ser individualistas. Olhar nosso curral e dizer que o resto é
> problema dos outros.
>
> Não sei se concordam com minhas reflexões. Acredito que esta seja a minha
> primeira manifestação nesta lista (para este tipo de assunto). Não pretendo
> fazer muitas outras (se é que farei outra). Eu tento fazer minha parte.
> Como professor universitário, eu incentivo e muito os meus alunos. Eu os
> incentivo a melhorar, a não tornarem-se os políticos que tanto reclamamos,
> nem os empresários que temos. (Acredito que tenha ficado claro no cenário
> atual que a corrupção não está no governo, mas sim na sociedade. Um
> político não consegue desviar verba, se não tiver uma empresa que seja
> contratada e o ajude nesta tarefa).
>
> Se eu conseguir com que alunos sigam na honestidade, mesmo vendo a
> desgraça e o caminho "fácil" ao seu lado... Se eu conseguir que dois alunos
> o façam, já será muito bom. Se eu utilizar a ideia de marketing de pirâmide
> (que é terrível), se este dois conseguirem mais dois... já seremos 7.
> Agora, mesmo terrível o marketing de pirâmide, eu também preciso me
> enganar, para continuar acreditando que pode existir solução para o
> problema.
>
>
> Talvez o que doa mais não é isso tudo. Hoje, praticamente temos uma única
> voz no Brasil inteiro: todos contra a corrupção! Não é lindo isso? Mas a
> corrupção continua... então, alguém está mentindo! Quem? Nós! O povo
> brasileiro. Essa é a tristeza maior. Não reclame dos políticos (apenas),
> olhe a seu lado, você está fazendo correto? Quando se paga 10 reais para um
> segurança de casa noturna, para evitar a fila, não é corrupção? O que isso
> incentiva? Que o dinheiro ganha sobre os outros... Quem pode mais... Que
> tudo tem um jeitinho... A mensagem que fica é mais forte que o valor. Se
> são 10 reais ou se são 10 milhões... roubo é sim ou não... não é quantidade.
>
> Ai eu digo, que adianta uma escola boa se nós (sociedade brasileira)
> ensinamos o errado para nossas crianças todos os dias. A escola não vai
> resolver. O problema é nosso!
>
> Porque não me manifesto, nem pretendo fazê-lo muitas vezes (se é que farei
> de novo): porque todos nós temos ideias e sugestões para solução, mas ficar
> discutindo e não colocá-las em prática é o mesmo que nada (esse é minha
> opinião). Antes de mais nada, espero ser justo (e quando não o for, pois
> todos erram, que seja por ignorância e desconhecimento, mas não
> intencionalmente). Honesto, acredito que sou. Então, tento dedicar o meu
> tempo aos alunos, que são aqueles que poderão fazer algo no futuro para
> resolver este problema e eu (nós) sou (somos) quem tem a obrigação de fazer
> algo no presente para resolvê-lo! Não adianta transferir o problema para os
> outros.
>
> Resumindo: Não sei, mas os resultados do PISA não me convencem (do ponto
> de vista de ensino), no sentido comparativo entre países. Tão pouco não
> acho que o PISA não é útil (tenho plena certeza que é uma informação
> importante). Não que eu ache que aqui está uma maravilha, mas é para se
> pensar que a Europa e os Estados unidos estão sempre bem (não apenas no
> PISA, como em outros muitos indicadores). Quem faz a metodologia? quem tem
> o poder econômico? Isso tudo parece colocar a raposa para proteger os
> coelhos.
>
>
> Abraços,
>
> adriano.
>
> _______________________________________________
> abe mailing list
> abe em lists.ime.usp.br
> https://lists.ime.usp.br/listinfo/abe
>



-- 
Pedro Luis do Nascimento Silva
*ISI President 2015-2017*
IBGE - Escola Nacional de Ciências Estatísticas
IBGE - National School of Statistical Sciences
Phone: +55 21 21424957
-------------- Próxima Parte ----------
Um anexo em HTML foi limpo...
URL: <https://lists.ime.usp.br/archives/abe/attachments/20161210/24c1940f/attachment.html>


Mais detalhes sobre a lista de discussão abe